O fim da incidência da contribuição social sobre o FGTS
Caminha para a extinção, a partir do mês de janeiro de 2007, a incidência da contribuição social de 0,5% instituída sobre os depósitos mensais do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) efetuados pelos empregadores. Contudo, mesmo em seus momentos finais, a contribuição ainda possui alguns aspectos que merecem uma análise mais cuidadosa.
Relembrando seu histórico, a alteração das alíquotas referentes aos recolhimentos ao FGTS surgiu com a Lei Complementar nº 110, de 2001, que visava custear o complemento da correção monetária expurgada das contas do FGTS durante os planos econômicos Verão, em 1989, e Collor I, em 1990. A lei, que surgiu no esteio de reiteradas decisões judiciais que garantiam a reposição da correção monetária a todos aqueles que recorreram ao Poder Judiciário, não apenas instituiu a contribuição de 0,5% sobre os depósitos mensais do FGTS pelo período de 60 meses, mas também adicionou 10% sobre o saldo da conta do FGTS quando da rescisão do contrato de trabalho, igualmente a título de contribuição para tal custeio.
As únicas exceções à contribuição de 0,5% sobre os depósitos mensais compreendiam as empresas inscritas no Simples (cujo faturamento anual não ultrapassasse o limite de R$ 1,2 milhão), as pessoas físicas que figurassem como empregadores de trabalhadores rurais e cuja receita bruta também estivesse limitada ao patamar de R$ 1,2 milhão por ano e os empregadores domésticos, sendo esses últimos também desobrigados do adicional da contribuição de 10% sobre o saldo da conta do FGTS, incidente por ocasião da rescisão do contrato de trabalho.
Inicialmente, a Lei Complementar nº 110 estabelecia que a nova alíquota sobre os depósitos mensais entraria em vigor 90 dias após a sua publicação, ou seja, em outubro de 2001. Entretanto, uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) questionando a instituição dessas contribuições sociais dentro do mesmo exercício fiscal acabou sendo acolhida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que definiu sua aplicação apenas a partir do mês de janeiro de 2002 - e, conseqüentemente, com término em dezembro de 2006. Com isso, o pagamento da contribuição social de 0,5% sobre os depósitos mensais pelos empregadores se encerra no mês de competência de dezembro de 2006, cujo pagamento pelo empregador ocorrerá em janeiro de 2007.
Como o julgamento da Adin ocorreu somente em novembro de 2002, várias empresas já haviam efetuado o recolhimento do FGTS com o acréscimo da contribuição social entre os meses de outubro e dezembro de 2001 - ou seja, antes de ser legalmente exigível. As empresas que assim fizeram possuem um crédito referente às contribuições deste período, cujo valor é passível de ser restituído ou compensado, caso se decida enfrentar o moroso e burocrático procedimento para tanto.
No entanto, outra discussão muito mais séria permanece. Tanto a lei complementar quanto o decreto que a regulou não estabelecem qualquer prazo de vigência da contribuição adicional de 10%. Embora alguns defendam que sua obrigatoriedade também se extingue a partir de janeiro de 2007, essa interpretação pode ser questionada. Isso porque a limitação a um período de 60 meses está inserida em um parágrafo do artigo que trata apenas da contribuição sobre os depósitos mensais, não se repetindo com relação à contribuição de 10% sobre o saldo do FGTS por ocasião da rescisão do contrato de trabalho. Presumir sua limitação a um período de 60 meses, nos mesmos termos da contribuição de 0,5%, pode se revelar uma decisão perigosa para as empresas, que passam a ficar suscetíveis de autuação pelos órgãos de fiscalização.
Por sua vez, embora o conselho curador do FGTS ainda não tenha se pronunciado oficialmente sobre a extinção da contribuição social de 10%, caso se decida pela sua manutenção, estaremos diante de um posicionamento contraditório e equivocado, uma vez que ambas as contribuições surgiram na esteira de uma situação atípica e transitória, não se justificando sua perpetuação.
No entanto, o futuro parece reservar boas novas, já que o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, afirmou que pleiteará a extinção da contribuição de 10% como meio de desonerar os setores produtivos da economia e como estímulo para as contratações formais no mercado de trabalho. Com certeza, é uma informação que a sociedade e, em especial o setor empresarial, recebe com alívio, diante da experiência recente com encargos que tinham caráter inicialmente transitório e que acabaram por permanecer, contribuindo para a pesada carga tributária nacional.
Ainda será preciso aguardar as próximas deliberações do conselho curador do FGTS, ou mesmo alguma nova norma legal, para que se possa ter a tranqüilidade jurídica necessária quanto ao não recolhimento do adicional de 10% sobre o saldo da conta do FGTS quando da rescisão dos contratos de trabalho a partir de janeiro de 2007.
* Marcelo Pereira Gômara e Ana Cláudia Akie Utumi são advogados e, respectivamente, sócios da área trabalhista e tributária do escritório Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados.
Fonte: Valor online - 16/10/2006