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Notícias Tributárias

Mudanças no CPC e execução trabalhista

Sancionada em dezembro de 2005, a Lei nº 11.232 trouxe mudanças substanciais ao Código de Processo Civil (CPC), sobretudo no que se refere à execução das sentenças. A legislação revogou os artigos que versavam sobre esse tema como sendo um processo autônomo e inseriu uma fase denominada "do cumprimento da sentença" dentro do processo de conhecimento.

Em outras palavras, buscando tornar o processo mais ágil, a lei eliminou toda a parte que tratava da execução das sentenças judiciais como sendo um novo processo. Agora a execução passa a ser apenas mais uma fase do mesmo processo que deu origem à sentença executada.

Tais alterações se justificam em grande parte porque era relativamente comum que a fase de execução de uma sentença judicial durasse mais tempo do que a fase que originou a própria sentença. Assim, as alterações trazidas pela Lei nº 11.232 buscam primordialmente acabar com a demora na execução.

Na prática, dentre outras alterações, quando do início da execução da sentença não haverá mais a citação na pessoa do devedor, mas a intimação na pessoa do advogado já com procuração no processo, uma vez que era freqüente o devedor se furtar a ser encontrado. Após a intimação, o débito deve ser pago em 15 dias, sob pena de multa automática de 10%. Não havendo pagamento, expedir-se-á o mandado de penhora e avaliação e somente após o devedor poderá ingressar com o recurso próprio da fase de execução, que, de acordo com a lei, passou a se chamar impugnação e não mais embargos do devedor.

Outro ponto de alteração está na execução provisória - aquela onde o processo ainda está pendente de recurso -, na qual os créditos de cunho alimentício têm tratamento privilegiado, podendo ser prontamente liquidados e pagos ao credor.

Dentre a comunidade jurídica trabalhista, muito se tem discutido sobre a aplicabilidade de tais mudanças no âmbito do processo do trabalho. Muitos pregam que a adoção da Lei nº 11.232 no processo do trabalho é perfeitamente possível. Apesar de o processo trabalhista ser célere por natureza, os defensores da aplicação do Código de Processo Civil baseiam seu entendimento em dois princípios que norteiam a Justiça do Trabalho: o da aplicação da norma mais benéfica e o da celeridade processual. Para eles, o fato das alterações trazerem ainda mais agilidade ao processo as torna, por conseqüência, benéficas aos trabalhadores, que teriam seus créditos satisfeitos mais rapidamente.

No entanto, entendemos que a subjetividade de tal critério pode acarretar interpretações divergentes sobre o que seria mais célere e benéfico, o que acabaria por gerar incertezas e até o aumento da quantidade de recursos na fase de execução. Vale lembrar que a gênese das regras processuais reside justamente na padronização de procedimentos de modo a garantir a certeza nos atos processuais e, por conseqüência, estabilidade e segurança entre os litigantes.

Os que defendem a não-aplicação das novas regras processuais cíveis ao processo do trabalho também têm ao seu lado argumentos jurídicos bastante plausíveis. Para eles, as alterações do Código de Processo Civil não podem ser extensivas ao âmbito trabalhista devido a dois preceitos contidos na própria Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O primeiro dispõe expressamente que o processo trabalhista é regido pelas normas estabelecidas na CLT. O segundo reza que apenas nos casos omissos é que o Código de Processo Civil poderá ser utilizado, e ainda assim, somente se não houver incompatibilidade com as regras trabalhistas.

É certo que a CLT possui todo um capítulo que disciplina a execução das decisões trabalhistas. E é certo também que o processo trabalhista é rápido por natureza. Como prova da celeridade do processo trabalhista, vale lembrar que a penhora on-line e a desconsideração automática da pessoa jurídica foram dois mecanismos que, embora severamente combatidos pela advocacia patronal, se desenvolveram no contencioso trabalhista.

Vale dizer que, caso a nova sistemática processual civil seja adotada nos processos trabalhistas, haverá o sério risco de irreversibilidade da execução provisória. Pela nova lei, os créditos de cunho alimentício, como são consideradas as verbas trabalhistas, têm tratamento diferenciado e poderão ser liberados ao empregado sem que haja decisão final do processo e sem a necessidade de qualquer garantia por parte do credor. Tendo em vista que os magistrados trabalhistas, contrariando entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST), têm sistematicamente admitido a penhora on-line na execução provisória, o cenário ficará mais tenebroso na hipótese em estudo.

Deste modo, entendemos que a aplicação das alterações trazidas pelo Código de Processo Civil não se aproveitam ao processo do trabalho. Em primeiro porque a lei aplicável, no caso a CLT, já possui sistemática própria, sem omissões a serem sanadas. E em segundo porque todas as regras contidas na CLT já estão pautadas na economia processual e na celeridade. Ademais há que se refletir sobre a probabilidade de se tornar célere o que já é célere por natureza em detrimento da segurança jurídica das relações processuais. Mais coerente seria que o legislador trouxesse expressamente à CLT as alterações que se entendessem necessárias.

* José Guilherme Mauger e Cristiane Fátima Grano Haik são advogados da área trabalhista do escritório Pompeu, Longo, Kignel & Cipullo - Advogados.

Fonte: Valor online - 28/09/2006