Divisão de lucros entra na mira da Previdência
As multas que têm sido aplicadas pela Previdência Social nas empresas que não cumprem todas as regras da Lei nº 10.101/00 para o pagamento da Participação nos Lucros e Resultados (PLR), têm atormentado a vida dos empresários, geralmente pegos de surpresa por penas pecuniárias que vão de R$ 300 mil a R$ 90 milhões, dependendo do porte do negócio. Nos últimos três anos, pouco depois da entrada em vigor da lei, em 2001, os auditores previdenciários aumentaram muito o rigor de fiscalização e têm aplicado penalidades diante do menor descuido dos empregadores.
Para que a Previdência entenda que o valor pago pela empresa é realmente referente à participação nos lucros, e não uma forma de burlar o Fisco, e que, portanto, está desvinculado da remuneração do empregado e do recolhimento de contribuição previdenciária, os empresários precisam cumprir uma série de regras estabelecidas na Lei nº 10.101/00 – transformada em lei depois da publicação de uma série de medidas provisórias que trataram do tema desde 1994.“Estas regras são desconhecidas de grande parte das empresas, que acreditam que estão fazendo o pagamento da maneira correta e são pegas de surpresa por estas multas altas. Centenas de empresas têm sido punidas e estão vendo seu orçamento ser afetado por isso”, conta o advogado Marcel Cordeiro, do Pompeu, Longo, Kignel e Cipullo Advogados. Só em seu escritório, de porte médio, o advogado tem tido uma decisão administrativa ou de 1ª Instância a cada dois meses referente ao assunto. Além disso, a menor multa aplicada pela Previdência em um de seus clientes foi de R$ 300 mil, em uma pequena empresa.
“Ainda não há decisões dos tribunais superiores, pois o tema é muito recente. E esse é um outro motivo para os empresários ficarem atentos e seguirem as regras da lei para evitarem problemas com a Previdência. Não sabemos ainda como será a Jurisprudência”, explica o advogado Cristiano Gadelha Vidal Campelo, do Azevedo Sette Advogados. Recentemente, em seu escritório, Campelo atendeu o caso de uma grande empresa de Minas Gerais que possui filiais em dezenas de cidades brasileiras e foi multada em R$ 8 milhões por não ter cumprido todas as determinações da Lei 10.101/00 — a soma inclui, além da multa em si, o pagamento retroativo corrigido de contribuição previdenciária dos últimos dez anos, exigido pela Previdência. Um dos pontos que mais têm causado problemas aos empresários são as convenções coletivas estabelecidas pelos sindicatos. Geralmente, as entidades sindicais determinam que aquelas empresas que não realizam a distribuição de resultados devem pagar um valor fixo aos funcionários. “Imaginando que estão fazendo a coisa certa, e até para evitar problemas com o sindicato, as empresas acatam a determinação e efetuam os pagamentos fixos, o que é um erro”, diz Cordeiro.
Segundo o advogado do Pompeu e Longo, uma das regras principais do pagamento de participação nos lucros é o estabelecimento de metas claras e de valores variados de acordo com o cumprimento destes objetivos e do cargo do funcionário. “A Previdência entende que o fato de a empresa pagar valores fixos e iguais a todos os empregados mostra que não houve estabelecimento de metas e, portanto, não se trata de PLR, e sim de pagamento extra de salário”, explica. Uma forma de solucionar esse problema sem desagradar o sindicato e cumprindo as regras da Lei 10.101/00 é convocar a entidade sindical para fechar um acordo coletivo apenas para a empresa, determinando valores diferentes de pagamento para cada funcionário ou setor, de acordo com o atingimento das metas.
Sólon Cunha, do Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados, que cuida atualmente de pouco mais de dez casos de grandes empresas multadas, ressalta que antes de definir as metas e os valores, os empregadores devem sempre negociar com pelo menos um representante dos funcionários para chegar a um acordo sobre as regras. Isso porque a lei determina que as normas para o pagamento da participação nos lucros devem ser transparentes e claras para todos os trabalhadores. Segundo os advogados, outras formas de fazer isso são a realização de reuniões com assinatura de atas com todos os empregados e o envio de e-mails, que também devem ser impressos, detalhando aos funcionários os procedimentos adotados.
Independente da negociação feita com os empregados, é imprescindível convidar um representante do sindicato para participar de todas as negociações que sejam feitas com um ou mais representantes dos funcionários a respeito da PLR, já que a participação do sindicato dá segurança jurídica à relação. Mesmo que o representante da entidade não compareça, é preciso arquivar documentos físicos, como e-mail ou carta, que comprovem o convite efetuado, de acordo com o advogado Marcelo Gômara, do Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados. “Normalmente os representantes sindicais não comparecem. Mas como a Previdência está extremamente rigorosa, se a empresa não tiver como provar que convidou o sindicato e foi ele que não compareceu, são grandes as chances de uma multa ser aplicada”, afirma Gômara.
O advogado Daniel Neves, do Leite, Tosto e Barros Advogados Associados, faz outro alerta aos empregadores. Além das multas fixadas pela Previdência, as empresas que não determinam metas, não tornam o processo de pagamento de PLR transparente aos funcionários e efetuam pagamentos fixos todos os meses, correm o risco de sofrer ações judiciais de seus próprios trabalhadores. “Eles podem alegar que estes valores eram parte do salário e exigir o recolhimento de todos as contribuições e impostos cabíveis na Justiça. Casos assim não são incomuns”, diz.
Também por isso, ressalta Gômara, é imprescindível que empresários e empregados ajustem por escrito as regras para o pagamento de participação nos lucros e resultados. Gômara conta que, atualmente, tem de 40 a 50 casos em seu escritório referentes às multas aplicadas pela Previdência. Há poucos meses, um de seus clientes, uma empresa de grande porte que é uma das quatro únicas de seu setor no país, foi multada em R$ 90 milhões e está discutindo judicialmente a autuação.
“O pagamento da PLR é determinado por esta lei e pela Constituição Federal. Todas as empresas privadas do país são obrigadas a efetuá-lo. O que precisa ser discutido, de forma clara e transparente com os funcionários, para que todos entendam quais são as metas estabelecidas, são as regras e os valores. Não há piso, depende da negociação entre funcionários, sindicato e empregador”, conclui Gômara, ressaltando que regras claras, além de evitar problemas com a Previdência, têm mostrado que servem de motivação aos funcionários.
Fonte: DCI - 24/10/2006